segunda-feira, 15 de junho de 2009

Sobre um navio

Querido J.,

O navio chegou, já partiu e eu ainda não entendi sua rota.
No início, dizia que esse era o começo de uma viagem direta, sem escalas, rumo ao destino que eu tanto queria.
Comprei então a passagem, convicta de que ele cumpriria a rota prometida. Acreditando nas informações do balconista, e no próprio navio.
Pensei que ele me salvaria, eu precisava sair, precisava de sua segurança.
Por causa disso, passei dias admirando-o. Nunca havia reparado-o ali. Agora estava encantada! A sua fachada era tão imponente! Pedi frequentemente ao comandante para que eu pudesse passear pelos seus corredores, e ele sempre deixava. Era lindo! Tudo que eu sempre quis!
No dia marcado para a partida acordei cedo, arrumei minhas malas e esperei a hora certa. Fui a primeira a embarcar. Junto a mim estavam alguns velhos tripulantes do navio e alguns conhecidos meus. Acomodei-me em meus aposentos e esperei a partida.
O apito soou, e os motores começaram a funcionar. Havia chegado a hora! O coração subiu-me à garganta, era de verdade! Eu estava partindo.
Pouco tempo depois, porém, o inesperado aconteceu. Os motores desligaram-se, sem nenhuma explicação.
Fez-se um alvoroço de preocupação dos tripulantes, mas eu não saí de meu quarto. Fiquei ali, sem entender, esperando que o navio me explicasse o que tinha acontecido ou que alguém viesse me informar. Nenhum dos dois o fez.
Pouco a pouco as pessoas foram abandonando o navio , duvidando de sua promessa, de sua partida.
Depois de um tempo, procurei entender o que ocorrera, disseram-me que o navio decidira mudar sua rota.
No começo, senti-me confusa, mas não me importei. Adequei-me ao novo trajeto sem drama afinal, podia acompanhá-lo em qualquer lugar, desde que ele me tirasse dali.
Então esperei pacientemente a sua partida, não me importando para o tempo que isso pudesse demorar.
Até que vieram me avisar que o navio tinha alguns problemas, e que não partiria logo. Fiquei chateada, mas novamente disse que não tinha problema algum, eu esperaria o seu conserto também, afinal, eu não estava com pressa, e não tinha nem destino, só queria que ele tirasse âncora dali, alguma hora.
Saí para passear pelo navio, não havia mais ninguém ali. Todos haviam desistido, só eu acreditava que a viagem ainda pudesse acontecer.
Esperei mais alguns dias. Passeei pela cidade algumas vezes, li vários livros, e dormi bastante, esperando o tempo que o navio precisava, e nada.
Algum tempo depois fui informada de que o navio não partiria mais. Desistira da viagem também, como os outros. A alvoroço inicial da partida desaparecera, e os tais problemas do navio não permitiriam que a viagem acontecesse por completo.
Só então desisti também. Juntei minhas coisas e voltei para casa, triste como quem volta de um enterro, sabendo que voltaria à realidade.
Não havia mais viagem.
Nem navio.
Mais uma vez, era eu e o vento, lutando por atenção no dia a dia, e ele sempre ganhava.
A rotina bateu de novo à porta, com ela a solidão.
Não tinha para onde ir.
Eu estava sem rumo, sem norte, sem cruzeiro do sul.
Deixei que a vida tomasse seu curso natural, parei de planejar, e de sonhar.
Até hoje que depois de alguns meses, voltei no porto.
O navio não estava mais aqui.
Curiosa, perguntei ao balconista, ele me informou que ele havia partido há dias.
Talvez o problema fosse eu.
Talvez o navio não quisesse fazer a viagem comigo, talvez eu tivesse acreditado demais, sonhado demais e exigido demais.
Talvez aquela não fosse a hora certa.E talvez nem o navio.
Continuei andando e deparei-me com outro navio. Completamente diferente do anterior, mas igualmente encantador.
Por impulso, dirigi-me ao balconista e comprei a passagem do tal navio.
O apito soou, ele está partindo. E eu estou embarcando. Quem sabe dessa vez eu complete a viagem?
Enquanto isso, estou de férias!
Não deixe de me escrever!
M.

Um comentário:

  1. Depois me lembra de assistir um filme com vc: "A felicidade não se compra".
    Vc vai entender!

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